Tudo o que precisa para mudar de vida: medo de se arrepender de o não fazer

Já alguma vez sentiu que aquilo que estava a fazer não o preenchia verdadeiramente? Já passou pela experiência de olhar para o futuro e aquilo que vê não é o que realmente quer? Já acordou sem vontade de trabalhar, sentindo-se angustiado ainda antes de sair da cama?

 

Eu já! E por isso decidi mudar de vida.

Por um conjunto de razões que hoje não cabem aqui, tirei o curso de fisioterapia. Convém dizer que foi a minha primeira escolha. Gostei do curso e tive uma performance académica bastante boa. Aliás, fui o melhor aluno da minha turma e recebi até um prémio que, curiosamente, acabei por nunca reclamar.

Comecei a trabalhar como fisioterapeuta aos 20 anos. Era muito novo. Dois fenómenos ajudaram a esse facto. O primeiro, é que como tinha iniciado a então escola primária com 5 anos e não 6, estive sempre um ano adiantado. O segundo, é que na altura era-se Fisioterapeuta, apto a trabalhar, ao fim de 3 anos de curso. O 4º ano fi-lo já a trabalhar, em regime pós-laboral.

Pois bem, lembro-me que um dia, no final da jornada de trabalho parei, reflecti no dia que terminava, nos anteriores, nos futuros, e senti angústia. A realidade revelou-se-me de forma clara e dura: não queria fazer aquilo o resto da minha vida. Aliás, não estava seguro que o quisesse fazer muito mais tempo! Penso que isto sucedeu pouco depois do primeiro mês de trabalho… Convém também referir que para 20 anos e recém-formado, o vencimento que auferia era bastante simpático, sobretudo quando visto à distância dos anos.

As semanas passaram e tive que mudar de emprego porque onde estava não era compatível com o 4º ano do curso, que estava prestes a iniciar. O 2º local onde trabalhei foi a machadada final. Detestei realmente trabalhar lá. E aí, por vezes, acordava sem vontade de trabalhar, frustradíssimo. Apesar disso, nunca faltei. E não duvido que fiz um trabalho sério e profissional. Mas, sem prazer.

O mundo é dinâmico – felizmente – e isso abriu-me a possibilidade de mudar de novo de emprego. Desta feita, trabalhava num gabinete de fisioterapia de referência da cidade do Porto e isso aplacou um pouco o meu desejo de mudança de vida. Aplacou mas não o eliminou. Definitivamente, apesar de gostar muito da fisioterapia – ainda hoje gosto – ser Fisioterapeuta “clínico” não era o meu caminho.

E quanto mais o tempo passava, mais isso ficava claro. Fui dando ouvidos à minha voz interna e ficou claro que o que me apaixonava e punha a sonhar era o mundo dos negócios. Apercebi-me, inclusivamente, que era algo que já me acompanhava desde adolescente mas ao qual nunca tinha dado ouvidos de forma estruturada. Todavia, com 21, talvez 22 anos, não sentia que fosse o momento certo para montar um negócio. Pensava que ainda não sabia o suficiente para dar esse passo.

Foi então que decidi fazer um MBA. Decidi, candidatei-me e entrei. E assim, mudei de vida. Despedi-me do local onde trabalhava e entrei na então Escola de gestão do Porto, hoje Porto Business School. Creio que a primeira aula foi a 28 de Julho de 2003. Tinha 22 anos. Era muito novo (demasiado, porventura) e, tanto quanto sei, o primeiro Fisioterapeuta a fazer um MBA em full-time.

O MBA entretanto foi-se aproximando-se do fim e não fazia a mínima ideia do que fazer a seguir. Estava a adorar aprender gestão e ter aquele contacto com empresas e pessoas ligados ao mundo dos negócios e, portanto, queria continuar a aprender. Mas, será que iria conseguir trabalhar em alguma empresa? Para todos os efeitos, era apenas um mero Fisioterapeuta com um MBA, 23 anos e sem experiência em gestão.

Mas então, a minha vida mudou de novo! Tinha entrado num processo de recrutamento para a Optimus e acabei por ser seleccionado. E assim, no dia 2 de Agosto de 2004 (já lá vão 11 anos!), a minha vida girava mais uns graus.

É muito justo reconhecer a abertura de espírito das pessoas que estiveram envolvidas nesse processo de recrutamento, uma vez que contratar um perfil tão diferente do óbvio envolve sempre mais riscos. Essas pessoas foram o Hugo Macedo, colega de MBA que apontou a existência do processo de recrutamento e que depois foi o meu primeiro chefe, o Miguel Tolentino, então nos Recursos Humanos, o Renato Ribeiro, que foi meu chefe directo quase todo o tempo que lá estive – alguém que me ensinou muito, talvez mais do que ele possa suspeitar, e o Manuel Ramalho Eanes, então director da unidade de negócios onde fui trabalhar, alguém com uma inteligência superior e um líder com grande autoridade.

Tive dois anos de uma aprendizagem incrível e de genuíno prazer no trabalho desenvolvido. Foi uma escola muito importante para mim. Uma escola com coisas boas e coisas más mas, indiscutivelmente, marcante. Entretanto, sentia renascer em mim o desejo de lançar a minha própria empresa. Mais do que uma coisa racionalizada, era um ímpeto visceral. Não queria passar a minha carreira inserido num sistema que não tinha qualquer possibilidade de influenciar a um nível realmente impactante. A certa altura comuniquei o meu desejo de sair da Optimus, concretizando-se a saída em Dezembro de 2006.

Mudei novamente de vida: despedi-me, deixando um emprego “seguro” e saltando para uma situação sem qualquer remuneração garantida. Sabia que o risco era elevado. Mas sabia também que, em bom rigor, talvez nunca fosse tão baixo. Tinha 25 anos e toda uma vida pela frente. E havia algo não me deixou vacilar: tinha jurado para mim mesmo que não voltaria estar em nenhum lugar onde durante demasiados dias seguidos sentisse falta de energia ao acordar…

Mudei de vida nesse Dezembro. Sou empresário desde essa altura. É tudo fácil? Nada disso! Arrependo-me? Nem por um segundo me arrependi, mesmo nos momentos mais difíceis que já vivi. É que há outra coisa que naquele dia 28 de Julho de 2003 disse para mim próprio no fim da primeira aula daquele terrível período de homogeneização do MBA (umas semanas de aulas intensivas para quem não tem um background de gestão/ economia ou, pelo menos, um claro background quantitativo), uma aulas em que fiquei bastante apreensivo – para ser eufemístico – com a minha capacidade de chegar ao fim do MBA. E o que disse, e que ainda hoje repito para mim próprio em algumas circunstâncias foi “prefiro o risco de não atingir o que me proponho, do que o risco de arrependimento por não ter tentado”.

Artigo por Hugo Belchior, disponível em empreendedores.pt

17/05/2017